Acreditamos que a passagem de Darwin pela Bahia e como ela contribuiu para a construção da teoria da seleção natural podem ser aproveitadas para construir ou reacender desde questionamentos muito fundamentais, como “Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos?”, até questões de interesse histórico, como “qual a Salvador que Darwin viu?”, chegando a problemas prementes de nossos dias atuais, como “Qual a Salvador de hoje e o que estamos fazendo para melhorá-la?”.

A bordo do navio Beagle, Darwin iniciou em 1831, aos 22 anos, uma jornada que repercutiria por toda a sua vida. Como Darwin escreveu, “A viagem do Beagle foi de longe o acontecimento mais importante em minha vida e determinou toda a minha carreira”. Foi ao ancorar na Baía de Todos os Santos ao meio-dia de 28 de fevereiro de 1832 que ele disse “A vista da cidade é magnífica!”. Dia 1º de março, portanto, há 176 anos atrás, Darwin escreveu: “Ninguém seria capaz de imaginar nada tão belo quanto a antiga cidade da Bahia; ela fica docemente aconchegada num bosque exuberante de lindas árvores e, situando-se sobre uma colina íngreme, descortina as águas calmas da grande baía de Todos os Santos. As casas são brancas e altivas... Os conventos, os pórticos e os prédios públicos quebram a uniformidade das casas; a baía é repleta de grandes navios. Em suma, e o que mais se poderá dizer? Ela é uma das paisagens mais lindas dos Brasis... Creio que os afetos, assim como as coisas boas, florescem e aumentam nestas regiões tropicais... A convicção de estar andando pelo novo mundo ainda é espantosa a meus próprios olhos...”. Aqui ele coletou animais, plantas, rochas e, principalmente, teve o seu primeiro contato com as florestas tropicais. Fruto das suas caminhadas pela cidade, foi que ele percebeu: “É uma coisa nova e agradável para mim tomar consciência de que se dedicar a história natural é fazer o meu dever e que, se eu desdenhar este dever, estarei ao mesmo tempo negligenciando o que por alguns anos me deu tanto prazer”.

A Salvador com que Darwin se encantou é muito diferente da Salvador atual, que, a despeito de manter algumas de suas belezas naturais, já não exibe aquela exuberante floresta que fazia com que ele ouvisse o canto dos pássaros e dos grilos a bordo do Beagle, ancorado na baía. Hoje, Salvador é a cidade com o menor índice de distribuição de renda do país, resultado também de algo que Darwin abominou: a escravidão. Quando desembarcou pela primeira vez, horrorizou-se ao ver-se em um país que ainda abrigava “aquele escândalo para as nações cristãs, os escravos”, que eram importados legalmente da África. A escravidão era um problema que sempre despertava as mais fortes emoções em Darwin, cujos avós participaram, ambos, do movimento antiescravagista. Também é pretensão deste projeto dar a conhecer o ser humano Charles Darwin, e não somente suas teorias científicas. Vale a pena abordar também suas crenças pessoais e como ele lidou com as relações entre elas e suas idéias sobre a origem das espécies e, em particular, da espécie humana, ao longo do desenvolvimento de suas idéias.

Sem dúvida, a teoria darwinista da evolução não pode deixar de figurar em qualquer tentativa de listar teorias que tiveram grande impacto sobre nossa visão sobre a vida e o universo. Idéias como a de seleção natural, tal como explicada por Darwin e Wallace, de ancestralidade comum e de um processo evolutivo aberto, sem finalidade ou meta, estão entre aquelas de maior influência sobre a compreensão humana. Não existe assunto mais atual para ser debatido, o que certamente este projeto proporcionará, porque vivemos dias difíceis, nos quais nos perguntamos se, como espécie, sobreviveremos à crise ambiental, mais recentemente manifesta no aquecimento global e nas mudanças climáticas.